A ALFABETIZAÇÃO DE NOSSO FILHO EM CASA
- Ribas Carneiro
- 23 de ago.
- 8 min de leitura
Relato aqui como foi a alfabetização de nosso filho em casa, contando as inseguranças do começo, os obstáculos e finalmente o resultado que compensou o esforço.
Alfabetizado em casa, ele leu toda a série Harry Potter aos 8 anos
A alfabetização em casa de nosso filho, a partir dos 4 anos fez dele um leitor. Aos 8, ele já tinha lido toda a série Harry Potter, inclusive o último livro com mais de 800 páginas. A partir dos 9 anos, começou a ler as aventuras de Sherlock Holmes.
Com o passar do tempo, o contato com a literatura esfriou um pouco, mas ainda temos um jovem leitor em casa. Para além da literatura, seu desempenho escolar é plenamente satisfatório. Ele tem uma rotina de estudos e não precisa sequer ser lembrado de fazer as tarefas de casa.
Como isso foi possível? Não sei ao certo. Há vários fatores para isso, mas até para tentar descobrir vou contar aqui como a coisa toda aconteceu.
Já posso adiantar que fizemos tudo paralelamente à escola, alfabetizamos nosso filho sem nenhuma atitude radical. Não fizemos homeschooling, apenas iniciamos a pré-alfabetização dele aos 3 anos, em horários curtos antes do jantar em casa.
Começamos com a matemática no Kumon, com aulas semanais no centro de estudos e práticas em casa de 15 minutos todos os dias. Algum tempo depois iniciamos a alfabetização.
Começos: rotina de leitura para o bebê dormir
Quando ele era bem pequenininho, é claro, estimulávamos a interação verbal. Mais importante nesse período foi evitar a exposição dele à tela de celular e limitar o tempo de TV. Sabíamos que a exposição precoce poderia acarretar problemas.
Além disso, tínhamos muita coisa para mostrar para ele; o mundo é cheio de novidades para um bebê, ele não precisava estar fixado numa tela.
Logo cedo também começamos com as canções infantis. Gostávamos muito das composições do Palavra Cantada, um grupo com boa qualidade musical e ótimas letras. À época a Galinha Pintadinha era inevitável, mas buscávamos selecionar as opções musicais.
Não lembro direito quando começamos a ler livrinhos infantis. Tínhamos vários, aqueles de banho, aqueles de pano, outros tantos mais tradicionais. Historinhas curtas, repetidas milhares de vezes antes de dormir. O de banho também repetido todos os dias, lembro até hoje... Tobi, a escavadeira.
Aos poucos fomos migrando para livros mais tradicionais, sempre com histórias curtas que embalavam o sono. Quantas vezes eu próprio bocejava ali, cansado, quase caindo de sono depois de um dia daqueles! Mas é preciso persistir!
Às vezes, quando ele permitia, eu tentava um livro novo. De qualquer forma líamos de tudo, inclusive poemas de Cecília Meireles e Manuel Bandeira. Além disso, às vezes eu contava histórias, que eu próprio ouvi em minha infância, inclusive contos folclóricos.
Essa foi a base. É importante ler para os bebês. A leitura em voz alta é o primeiro contato do bebê com o ritmo e a construção sintática típica do texto escrito. Esse é o primeiro passo.
As apreensões com o processo educacional
Já tínhamos clareza de que as escolas no Brasil não alfabetizam adequadamente, como já tratei em outro post. Somos professores universitários e vemos diariamente os resultados da formação escolar em nossos alunos. Posto o problema, tínhamos de buscar a solução.
Inicialmente, minha esposa pesquisou métodos de alfabetização. Foi um trabalho árduo, de repente surgia um método com uma promessa extraordinária, mas logo verificávamos que não tinha uma comprovação empírica razoável.
Depois de muita busca verificamos que o método fonético correspondia ao que procurávamos. Tratava-se de algo que tinha sua eficácia comprovada, afinal fomos alfabetizados por ele. Sabíamos que era um método que realmente ensinava a língua portuguesa escrita, cuja estrutura é fonética.
Precisávamos aprender a alfabetizar
Apesar de ser professor de português, eu nunca havia trabalhado com alfabetização. Sabia alguma coisa sobre o assunto em termos teóricos. Minha maior experiência se deu em sala com alunos do segundo ciclo, jovens e adultos. Era necessário, então, primeiro aprender.
Buscamos um caminho que nos dirigisse no ensino fonético da língua escrita. A pesquisa nos levou a conhecer o canal do Youtube Como educar seus filhos, de Carlos Nadalin.
Como foi o começo: a pré-alfabetização
Aos poucos fomos implementando as atividades que aprendíamos e descobrindo como fazer. Às vezes não dava lá muito certo, então fazíamos ajustes ou tentávamos novas abordagens. A pré-alfabetização seguia assim com foco nos sons, nas palavras, rimas e ritmos.
Realizamos também várias atividades de coordenação motora, inclusive coordenação motora fina, com traços, linhas, e muitas repetições. Algumas atividades encontradas na internet e um caderno de caligrafia deram muito resultado, em pouco tempo tínhamos nosso pequeno a escrever suas primeiras letras.
Minha esposa fez o curso de pré-alfabetização do Nadalin, online. Lá foi indicado um livro de alfabetização fonética, o Alfabetização: método fônico, de Fernando C. Capovilla e Alessandra G. Seabra.
Assim, depois de várias atividades de coordenação motora das mãozinhas, passamos a seguir o livro. Primeiro lemos todo o volume do professor, que tem informações muito importantes. Depois, sempre experimentando, começamos a abordar as vogais, a, e, i o, u e depois os sons mais fáceis, das letras f, j, m e assim por diante.
É importante trabalhar com esses sons mais simples, inclusive com o uso de algumas cançõezinhas. Aos poucos eles vão pegando e o processo, ao menos no nosso caso, fluiu de maneira muito natural.
Rotina
Já tínhamos uma rotina de lição em casa estabelecida pelo Kumon: a cada dia um bloquinho de atividades, que durava em torno de 10 ou 15 minutos. Acrescentamos mais 10 ou 20 minutos de lições de traçados, leitura dos fonemas e exercícios do livro.
Como a escolinha infantil não tinha lição de casa, estávamos livres para trabalhar. Infelizmente não havia na escola nenhum trabalho mais concreto de aprendizagem dos sons ou das letras, então restou a casa como lugar de alfabetização.
Devo mencionar que a aprendizagem assim, particular, é muito mais rápida, então não é preciso dedicar horas e horas, nem explicar muita coisa. Poucos minutos diários já dão conta do conteúdo.
Antes do jantar fazíamos essas lições e à noite continuávamos a ler nossos livrinhos. A rotina era diária, incluindo os finais de semana.
De repente tudo mudou
Guiados pelo livro de Capovilla, com uma rotina de estudos estabelecida, em cerca de um ano tínhamos avançado muito, estávamos já a entrar nos dígrafos, “nh”, “ch” etc., mas uma repentina mudança de planos fez as coisas saírem um pouco de controle.
Iríamos nos mudar para Portugal por um período de três anos. Foi tudo muito repentino. Nossa mudança fez com que nosso filho entrasse na primeira série de uma escola portuguesa.
Na Europa, o ano letivo começa no segundo semestre do ano civil, lá por julho, e dura até junho do ano seguinte. Como chegamos lá em setembro, o ano letivo já tinha começado e nosso filho teria de fazer um teste para ver se acompanhava a turma ou ficava na educação infantil.
Felizmente ele passou no teste, pois já estava praticamente alfabetizado além de bem adiantado com a matemática. Assim, mesmo iniciando as aulas com dois meses de atraso, ele acompanhou tudo muito bem.
A escola pública perto de casa atendia perfeitamente aos nossos critérios de qualidade e inclusive nos surpreendeu em muitos aspectos. Por isso, pudemos confiar à escola o restante processo de alfabetização de nosso filho.
O incentivo à leitura e acompanhamento dos estudos
Apesar de ser uma escola muito boa, não descuidamos de acompanhar os estudos de nosso filho. Mantivemos a disciplina com horário de lição de casa (lá havia muita lição de casa) e as leituras de livros antes de rezar e dormir.
Como nós, os pais, estávamos sempre lendo e os livros sempre estiveram por perto, muito naturalmente as crianças passaram a manusear livros e lerem por conta própria.
Vários livros foram importantes nesse período, mas devo destacar alguns marcos especiais, que acabaram por influenciar muito o desempenho de leitura de nosso pequeno.
Numa das primeiras feiras de livros que visitamos em Porto encontramos o Gravitty Falls - Diário de Dipper. Era o livro relacionado à série de TV. A série de animação é muito boa e o livro não ficava atrás. Uma das vantagens é ter vários tipos de letra, inclusive cursiva, acostumando o pequeno leitor com as variações de tipos gráficos.
Algum tempo depois surgiu lá em casa o fantástico O fantasma de Canterville, de Oscar Wilde. Trata-se de uma história bem conhecida, uma narrativa primorosa do grande escritor inglês. A tradução a que tivemos acesso era muito bem feita e, mesmo com alguns tropeços, o nosso leitor iniciante leu com competência.
Esse livro permitiu várias trocas de experiências, afinal eu tinha lido na adolescência uma versão em inglês facilitada e a história tinha me marcado muito. Foi ótimo reviver a leitura com meu filho.
Contando parece que tudo se desenvolveu de maneira contínua, mas não foi bem assim. Esses dois livros, por exemplo, depois de comprados rolaram por meses pela casa. Apenas depois de algum tempo começaram a ser folheados, depois lidos, então abandonados, depois retomados, num ritmo natural, sem pressa nem compromisso.
Além disso, essas leituras foram sendo intercaladas com livros emprestados da escola e releituras dos livrinhos infantis.
O momento de Harry Potter
Estava preparado o caminho para a leitura de Harry Potter. É claro que nosso filho assistiu a série de cinema, mas não todos os filmes. Ele já tinha o primeiro livro da série, Harry Potter e a pedra filosofal, tinha tentado ler uma vez, desistiu, mas depois retomou e apesar de alguma dificuldade inicial apegou-se à leitura.
O resultado foi que tivemos de comprar toda a série. Deve-se destacar aqui que ele leu na excelente tradução portuguesa.
Todas essas leituras não podiam cair no esquecimento, elas precisavam estar cada vez mais presentes na rotina. Assim, a cada capítulo eu dedicava um tempo para perguntar e, principalmente, ouvir os comentários que vinham do pequeno leitor. Não era questionário, a reprodução da história lida e os comentários surgiam de maneira espontânea, natural.
Conclusão
Não sei se fizemos certo, talvez tenhamos errado em vários pontos. Poderia, talvez, ter sido ainda melhor, mas os resultados são satisfatórios. Nosso filho se tornou, ao menos por um tempo, um leitor ávido e comprometido.
Ensinei a ele como fazer uma lista de livros lidos e fichas de leitura, para lembrar dos aspectos principais das obras mesmo tempos depois. Coisa simples. No computador, ele escreve a referência bibliográfica dentro das normas da ABNT e faz uma nota de rodapé com um comentário sucinto.
O mais importante é que nos divertimos conversando sobre essas leituras.
Ah sim! A irmã mais nova seguiu o mesmo caminho. Clom ela não tivemos um encontro tão intenso com a literatura, mas também não há desprezo total. Não é produtivo forçar a experiência, ainda há tempo pela frente.
E na sua casa? Como é, como foi, como será?
Se você passou, passa ou prevê que vai passar por uma experiência parecida, escreva. É bom trocar ideias. Em alguns momentos dessa caminhada nós nos sentimos sozinhos e um pouco desanimados. É melhor quando se pode compartilhar.
Há vários caminhos para o ensino em casa, muitas possibilidades, o que não pode acontecer é deixar de fazer alguma coisa.
Na realidade escolar que nos cerca temos de assumir o papel de educadores.
O importante é dedicar um tempinho a essa rotina.

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Olá, Professor Ribas Gostei do seu relato. Você e sua esposa, mesmo tendo uma boa formação acadêmica, mostraram tudo o que sentiram, na tentativa de fazer o melhor possível para ajudar na alfabetização do seu filho. Eu tentei fazer isso com minha filha, sem ter formação na época. Tentei passar a ela, o hábito da leitura. Li muito para a minha filha, desde bebê! Acho que ela tinha uns dois anos, eu li um livrinho bem simples. Chamava "O Gatinho Perdido". Depois, dei o livrinho para ela e pedi que contasse a história para mim. Pois ela foi folheando o livro e me contou a história toda e direitinho. Via as imagens e entendia o que estava escrito. Pena que na época ainda…