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Bibliocanto Volume XIX

Cristóvão Colombo é uma das mais incríveis e controversas personalidades históricas de todos os tempos. Podem fazer quantos protestos quiserem, podem tentar apagar seu nome da história, revisar seus feitos, nada disso mudará o fato concreto: Cristóvão Colombo mudou o mundo.

Retrato de homem, dito ser Cristovão Colombo, por Sebastião del Piombo, 1519.


CRISTOVÃO COLOMBO

Pouca coisa se sabe sobre sua infância e juventude. Nasceu em Gênova, por volta de 1451, talvez tenha recebido uma educação básica formal. Sabe-se que desenvolveu carreira marítima navegando no Mediterrâneo pela marinha mercante genovesa. Obteve experiência ainda pelo Atlântico e Costa da África Ocidental, junto de marinheiros portugueses.

Seu conhecimento empírico, junto da leitura das obras de Marco Polo e de astrônomos e cartógrafos da época, se aliou à sua intuição. Dessa forma, ele desenvolveu a teoria de que era possível atingir as Índias Orientais navegando sempre para o oeste. Um caminho que evitaria as rotas controladas pelos árabes ou a circunavegação da África, que ainda não se sabia se era possível.

Os portugueses acreditavam no projeto de navegação pela costa da África, que já vinham desenvolvendo há tempos; assim, quando o genovês expôs sua teoria na Corte Portuguesa, não obteve apoio. Depois dessa experiência, foi tentar a sorte na Corte Espanhola.

Em Espanha sua vida não foi fácil. Ele mesmo viria a confirmar que teve muitos reveses nas câmaras da corte tentando patrocínio para suas expedições. Após muita insistência, Colombo finalmente obteve apoio financeiro dos Reis Católicos da Espanha, Fernando e Isabel. Iniciava-se então uma das mais incríveis histórias de aventuras de todos os tempos.

AS VIAGENS DE COLOMBO

Cristóvão Colombo realizou quatro viagens à América.

A primeira foi financiada pelos Reis Católicos da Espanha. Colombo partiu de Palos, em 3 de agosto de 1492, com três navios: a Santa Maria, a Pinta e a Niña. Ele chegou a uma ilha nas Bahamas em 12 de outubro de 1492, marcando o primeiro encontro documentado entre o Velho e o Novo Mundo. Ele explorou várias ilhas do Caribe, incluindo Cuba e Hispaniola (atual Haiti e República Dominicana), antes de retornar à Espanha em março de 1493.

Com essa expedição, Cristóvão Colombo encontrou a glória na Corte Espanhola, foi nomeado “Almirante do Mar Oceano”, além de Vice-Rei e Governador Geral das terras que havia encontrado.

Coberto de honrarias, ele iniciou sua segunda viagem em setembro de 1493, dessa vez com uma notável frota de 17 navios e cerca de 1500 tripulantes, incluindo colonos. Colombo explorou várias ilhas do Caribe, incluindo Porto Rico e Jamaica, e fundou assentamentos em Hispaniola. Nesta ilha ele havia deixado um grupo de aventureiros na primeira viagem, mas ao retornar o acampamento estava destruída e todos mortos.

Essa viagem não foi tão gloriosa quanto a anterior, mas foi um marco importante para o projeto colonizador espanhol. Os colonos não encontraram a riqueza fácil que haviam imaginado e entraram em conflito com Colombo. O almirante acabou por retornar à Espanha em 1496, deixando seu irmão no cargo de Governador das novas terras.

A terceira viagem começou em maio de 1498. Colombo explorou a costa da América do Sul, chegando ao delta do rio Orinoco (atual Venezuela). Durante sua administração em Hispaniola, ele enfrentou a revolta dos colonos, que se queixavam de suas políticas e do tratamento duro que sofriam. Além disso, havia a exploração excessiva dos nativos da região em busca de ouro, o que causava distúrbios graves entre a população indígena.

As tensões culminaram em um levante liderado pelo colono Francisco Roldán. A corte nomeou enviou então, em 1500, um novo Governador, Francisco de Bobadilla. Ele tinha a missão de restabelecer a ordem. Bobadilla tomou partido dos colonos insatisfeitos e após investigações rápidas e controversas prendeu Colombo e seus irmãos, acusando-os de má gestão, crueldade e abuso de poder. Colombo e seus irmãos foram enviados de volta à Espanha, a ferros, no porão de uma caravela.

Ele não ficou muito tempo preso. Os Reis Católicos reconsideraram a situação e, em parte devido à influência de sua patrona, a Rainha Isabel, ele foi libertado em 1502. Mas ele nunca mais recuperaria o prestígio e a autoridade anteriores.

A quarta e última expedição partiu em maio de 1502. Colombo explorou as costas da América Central, visitando locais como Honduras, Panamá e Jamaica. Ele enfrentou tempestades e dificuldades, tendo seu navio encalhado numa ilha por quase um ano. Nesse local, sofreu com sua tripulação a escassez de recursos e os ataques dos nativos. Ele só conseguiu estabelecer uma relação mais respeitosa com os índios graças a seus conhecimentos de astronomia, que permitiram-no prever um eclipse e assim impressioná-los.

Essa viagem foi um fracasso total. Ele teve de ser resgatado e retornou à Espanha em 1504. Colombo nunca mais se recuperou. Envelhecido e doente, viria a morrer em 1506.

Essas viagens de Colombo tiveram um impacto duradouro na história mundial, alterando a compreensão geográfica e estimulando a exploração e colonização europeia nas Américas. Apesar de suas expedições e descobertas, Colombo não percebeu que havia descoberto um novo continente.

Mapa de Colombo, Lisboa, 1490. Teria sido feito numa oficina de Lisboa por um certo Bartolomeu e Colombo, mas não é possível assegurar a autoria.


OS TEXTOS EM QUE COLOMBO REGISTROU SUAS VIAGENS

Existem vários documentos históricos importantes relacionados à viagem de descobrimento de Colombo. Entre os originais mais importantes estão várias de suas cartas.

A “Carta de Colombo para Luis de Santangel”, de 1493, foi redigida após sua primeira viagem para aquele que era um de seus principais financiadores. Nela, ele descreve suas descobertas e os eventos da viagem. Essa carta foi logo impressa e amplamente distribuída, contribuindo para a divulgação das notícias sobre a descoberta do Novo Mundo.

Há ainda um conjunto de cartas de Colombo dirigidas aos Reis Católicos de Espanha, redigidas entre 1493 e 1504. Nelas, combinam-se os relatos, as análises da situação e os pedidos de apoio para sua expedições. São importantes documentos sobre seus empreendimentos exploratórios e suas reivindicações políticas.

Há ainda dois diários de bordo. O mais famoso é o da primeira viagem. Embora o diário original não tenha sobrevivido, existem transcrições e versões posteriores, sendo a mais conhecida a de Bartolomeu de las Casas. Nesse relato, estão registradas as observações e experiências de Colombo durante a jornada, incluindo o primeiro contato com a nova terra e a exploração de outras ilhas caribenhas.

Durante sua quarta viagem, Colombo manteve outro diário de bordo, em que relata as dificuldades encontradas e as descobertas feitas nas costas da América Central. Esse diário, conhecido como "Diário da Quarta Viagem", também fornece interessantes informações sobre as interações com as populações nativas.


Colombo perante os Reis Católicos Fernando e Isabel, por Emanuel Letze, 1843.


DIÁRIO DA PRIMEIRA VIAGEM DE COLOMBO

O diário da primeira viagem de Colombo é uma leitura muito interessante. Nele, Colombo descreve sua partida do porto de Palos, na Espanha, e os desafios enfrentados durante a viagem, como as tempestades e a ansiedade da tripulação.

Fundamental é o registro do avistamento de terras desconhecidas. Em 12 de outubro de 1492, após meses de navegação, a tripulação finalmente divisou uma ilha, a qual Colombo batizou de San Salvador. No diário ele descreve a paisagem, a flora e a fauna do local, assim como os encontros com os nativos, a quem ele chamou de "índios" erroneamente, acreditando ter chegado às Índias Orientais.

Além da origem da denominação “índio”, para o leitor brasileiro e português é interessante comparar as reações de Cristovão Colombo e Pero Vaz de Caminha ao entrarem em contato com a população nativa e a natureza das novas terras. Em ambos, pode-se identificar o maravilhamento com aquelas paragens e pessoas nuas. Em Colombo há ainda uma clara associação com o ideal de Paraíso Bíblico.

Colombo, porém, passa muito mais tempo entre os nativos que Caminha e, contrariamente ao português, logo assume uma postura de genuíno conquistador e passa a ver naqueles nativos uma forma de explorar a região em busca de ouro. Sim, ele também percebe a ausência de uma religião mais estruturada e o potencial de catequização do povo, mas há, comparativamente, uma menor simpatia de Colombo pelos indígenas do que a que encontramos em Caminha.

A edição do diário de bordo é póstuma e foi elaborada por Bartolomeu de las Casas, historiador e padre que compilou informações sobre as viagens de Colombo e redigiu o relato em terceira pessoa. Há controvérsias ao redor da obra, mesmo assim é uma fonte valiosa de informações sobre a primeira viagem de Colombo ao Novo Mundo.

Quando você for ler essa obra, talvez ache estranho que a redação é feita em terceira pessoa. Não se sabe ao certo a razão disso, mas há hipótese. Pode ser que estivesse ligado a um costume da época entre pessoas em posição de autoridade em falarem de si mesmas em terceira pessoa, algo que Colombo teria assimilado. Outra razão possível é que Las Casas pretendia criar um relato objetivo e imparcial das viagens de Colombo; assim, ao escrever em terceira pessoa, ele poderia retratar os eventos de forma mais distante, menos influenciada por pontos de vista pessoais, e até mesmo conferir um tom mais formal e histórico ao relato.


Gravura do século V retratando os cinocéfalos, da edição francesa do Livro das Maravilhas.


UM UNIVERSO MEDIEVAL ENCONTRA O NOVO MUNDO

Os diários de bordo e as cartas de Cristóvão Colombo revelam a matriz intelectual daquele homem, um representante do Renascimento europeu do século XV. Em Colombo, a herança medieval ainda estava muito presente e apenas aos poucos e de forma não integrada o pensamento iluminista avançava.

Colombo é um homem à frente de seu tempo ao conceber que a terra é redonda. Mais importante ainda, ele tem a iniciativa de tirar partido desse conhecimento. Mas ao mesmo tempo ele revela conceitos e crenças medievais. Por exemplo, em seu diário da primeira viagem ele registra o avistamento de sereias:

“Ontem, quando o Almirante [Colombo] ia ao Rio del Oro, diz que viu três sereias que saltaram bem alto, acima do mar, mas não eram tão bonitas como pintam, e que, de certo modo, tinham cara de homem.”

Talvez Colombo tivesse visto focas, mas ele era marinheiro experiente, por que se confundiria? Como explicar esse avistamento?

Em outro momento, ele menciona em seu relato os cinocéfalos, homens com cabeça de cachorro, que teriam sido descritos pelos índios. Ele ainda entende que os nativos descreveram uma ilha habitada apenas por mulheres guerreiras, as míticas amazonas da mitologia greco-romana. Essa informação o deixa muito curioso e ele lamenta não ter tido a chance de achar a tal ilha. Curiosamente, ele desconfia quando os índios descrevem que há canibais numa determinada região, algo que depois se comprovaria verdade.

Chama a atenção ainda no diário o quanto os europeus queriam descobrir ouro. Esse desejo irrefreável influencia todas as interações entre eles e os nativos. Como cada grupo falava uma língua totalmente desconhecida, a linguagem gestual predominava e, em meio às dificuldades de comunicação, os espanhóis chegavam o tempo todo à conclusão de que os índios estavam tratando do mesmo assunto que eles: ouro. Um caso notável de superinterpretações.


LEMBRE-SE: conhecimento bom é conhecimento compartilhado. Se você gostou desse conteúdo mande para quem pode se interessar pelo assunto.


DISCLAIMER Essa é uma produção independente, sem patrocínio de qualquer natureza. As menções a obras são espontâneas e não constituem indicação de compra.

 
 
 

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